Sei que vou entrar em uma seara difícil de trafegar, mas, acho necessário pensarmos em algumas coisas.
Quando comecei a trabalhar com o acolhimento de mães e de famílias de bebês com síndrome de Down me confrontei com um discurso simplista que me incomoda que só: “um bebê com síndrome de Down é um bebê como outro qualquer, só vai demorar um pouquinho mais para aprender”. Era como se, no lugar do déficit cognitivo, se colocasse o atraso e, quanto mais se corresse atrás do relógio, mais perto se chegaria da “tal normalidade”.

Essa falácia – é isso mesmo, é só uma falácia que deveria ser repensada, até por questão de respeito – só faz criar mães sobrecarregadas, estressadas e frustradas porque, não importa o quanto façam, sentem-se sempre devendo e correndo atrás do tempo. Se o andar demora a chegar, querem mais sessões de fisioterapia, se a fala custa a começar, mais sessões de fono. Há bebês e crianças que, quando a família tem mais condições, fazem mais de uma terapia por dia, 5 dias por semana. São gastos de energia e de dinheiro que, na maior parte das vezes, não levam a nenhum novo lugar. E há terapeutas que fazem uso da ansiedade materna para tirar vantagem. E como!

Circulando por grupos de mães, tenho visto a agonia das mães de bebês que esperam ansiosamente pelos marcos de desenvolvimento que custam a chegar: o sentar, o andar e o falar são esperados e os dias são contados até que eles cheguem. A agonia do passar do tempo judia, a comparação entre as crianças traz desilusão e a frustração só faz aumentar, aumentar e aumentar.

Quando nos atentamos para o que diz o as Diretrizes de Atenção à pessoa com Síndrome de Down do Ministério da Saúde, percebemos que as pessoas com Síndrome de Down são mais suscetíveis a certas questões de saúde e precisamos ficar atentos a essas questões. Esses dados estatísticos não têm o objetivo de rotular as crianças e coloca-las no mundo do “eles são assim”, muito pelo contrário. Têm a função de informar e, acima de tudo, são uma forma de explicar os porquês de muitas doenças crônicas ou repetitivas, nos levando a buscar soluções para problemas que são comuns à maioria.

Entendo que, em questão de estatística, se colocarmos a cabeça no forno e os pés no freezer estaremos na temperatura média e ideal. O que
não nos dá licença para que fechemos os olhos e deixemos de ver as circunstâncias que nos rodeiam.
Entretanto, tenho visto mães se posicionarem assim: “costumo dizer que o que não acrescenta positivamente p minha filha eu deleto. E tem dado super certo!!”
Ou seja: o que não põe meu filho o mais perto na normalidade não me interessa. Não quero nem saber a causa das dificuldades que vêm embaixo do guarda-chuva da síndrome de Down afinal, é uma criança como outra qualquer e essa demora será compensada lá na frente, desde que eu respeite seu tempo.

Não estamos falando de demora, estamos falando de déficit. Déficit é falta. E, por mais que se tente, a falta não se resolve por si só.
Se não nos atentarmos a essa diferença e formos honestos com as novas famílias, sempre teremos mães angustiadas, frustradas e estressadas.
Está mais do que na hora de se fazer diferente.
Texto de Monica Xavier
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